diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

De um calor

Era um domingo, não sei.
Não lembro bem.
Você estava ao meu lado.
Deitados naquela cama.
Não, não era uma cama.
Apenas um colchão, jogado despudoradamente no chão.
Um fino lençol branco o cobria.
E você me dizia, com aquela voz mansa:
- Deus está morto! O mundo não roda mais.
E sorríamos.
Como duas crianças.
E éramos, sim, duas crianças.
O vento entrava pela janela e nem nos apercebíamos daquilo.
Era Deus presente ali.
Arre!
Por que metemos Deus entre nós?
O que havia em nossos corpos era o diabo.
Fogo, carne e desejo.
A nos consumir naquelas tardes quentes de um verão.
Naquele verão fomos como Adão e Eva no Paraíso.
Caminhávamos nus dentro do apartamento.
Pouco nos importávamos com as milhares de janelas que nos espiavam.
Dentro daquelas quatro paredes estávamos num paraíso.
Cometíamos o pecado a luxúria, mas não estávamos em pecado.
Era o amor.
Com todos os seus perfumes, odores e suores.
Animais, aninhávamos nossos corpos.
Teu sexo contra o meu sexo.
Exalávamos ternura e assim nos entendíamos.
Que música ouvíamos? Não sei ao certo.
Talvez a sua cantora preferida, talvez a minha...
Quem sabe não era uma canção que as duas cantaram juntas?
Da memória daquele verão só me ficou o teu corpo.
Tão tenro, tão macio, jovial.
E o gosto de tua boca.
Como doce. Doce que nunca mais provei.
O verão acabou.
E com ele acabou o nosso idílio.
Fomos cada uma para um lado.
Lado opostos, que fique bem claro.
Nunca mais nos cruzamos.
E aquele verão...
As brisas de verão, de qualquer verão me trazem as lembranças de teu corpo.
E eu dou um sorriso.
Tímido, é verdade, mas um sorriso sincero.
E um sentimento de saudade bate.
Te digo, é sempre bom sentir o teu cheiro novamente.