diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

terça-feira, 21 de abril de 2009

quem perde?

eu não perco.
pois eu divido.
quem soma.
perde.
pois se isola.
se deixa roer.
pela solidão.
amor divido é lucro.
correspondido é bônus.
ônus pra quem não ama.
eu ganho.
pois amo.

Aposentadoria

Quando eu pensei em parar de escrever me sentei.
E comecei a pensar nas palavras que escreveria.
O papel me espera, limpo. Branco.
E uma enxurrada de frases se armaram em minha mente.
O relógio era implacável.
Minhas mão nervosar pegaram a pena.
Trêmulo arrisquei os primeiros versos.
Minha caligrafia já não era tão firme como antes.
Mas, mesmo assim continuei.
As palavras foram se organizando.
Desvirginando o papel.
Como o sol invadindo a manhã.
Os versos saiam fluídos.
Quando me dei conta o relógio havia dado duas voltas.
E eu estava no mesmo lugar.
Debruçado sobre laudas e laudas.
Sairam de mim várias páginas escritas.
E enfim descansei.
Aposentando a pena e minha mente.
Para nunca mais.
Para o sempre.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

não quero nada pra mim

mora em mim um velho.
que me deixa sério.
impaciente.
quisera morrer no tempo dele.
deixa estar.
um dia através do universo eu morrerei.
e minha poeira se espalhará no mundo.
como um jorro de alegria.
com um sopro do vento norte.
serei passado.
estarei quieto e silencioso.
como nunca fui em vida.
deixa estar.
tenho vontade de jorrar palavras de ordem.
mas calo.
aguardando que meu velho aja por mim.
ele que ancião sabe mais que eu.
meu velho espírito cansado.
de vagar através dos tempos.
não chore, não chore, ainda, não.
você tem balas de limão?
eu gosto de balas.
não sei nem por que falei em balas de limão?
me lembram minha infância.
deve ser isso.
deixa estar.
deixa ficar como está. como ficará eternamente.
de boleros antigos na vitrola penso em nada.
quando você se lembrar de mim.
lembre.
ou esqueça.
como queira.
tanto faz.
eu não quero mais saber.
nem ouvir.
às favas com lembranças longínquas.
todos estão velhos, desfeitos, borrados.
ou mortos.
ninguém sobreviveu a mim.
eu restei, só.
quantos passaram, ficaram atrás.
não!
eu não quero ser um velho.
eu quero ir antes.
deixem-me ficar atrás.
me percam no caminho.
esqueçam de mim.
se percam de mim.
desapareçam.
não tem chuva caindo.
nem banda passando.
não tem violão, banquinho, ipanema, copacabana.
nada.
tem fome, sede, miséria.
amores perdidos.
sangue em minha alma.
silêncio e som.
escuridão.
ladainhas ao longe.
requiéns para mim.
que me fui.
deixei de existir.
caí.

murro em ponta de faca

quanto mais sangram minhas mãos mais eu luto.
esmurrar ponta de faca.
eu sei que é minha a culpa.
não culpo ninguém.
tudo pertence a mim, a minha cabeça.
meus sentimentos.
eu sei.
gotas de sangue uso para escrever-te.
sem forças.
eu tento desorientadamente ainda amar.
e meus dedos vão ficando frios.
só sossego quando meu coração esfriar.
e pingar a gota de sangue final.

ofício

eu tenho medo de muitas coisas.
mas nunca tive medo de me atirar do trampolim.
de estar sob as luzes do palco.
ser seres que estão guardados nos armários de bibliotecas empoeiradas.
eu sempre quis ser outros.
o meu lado de várias faces.
eu consegui.
ter o privilégio de ser muitos.
e ao apagar das luzes voltar a ser eu.
que não tão simples sou.
desfeita a maquiagem, tirada a roupa.
voltando ao real.
o palco me permite gritar e se ouvido.
no mundo todos estão surdos para os normais.
eu vivi na ribalta.
vivi nos bastidores, chorando.
ilusão, esta é a marca de mim.
os momentos vividos não são meus.
as personagens me tomam.
eu já fui.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Rezamor

Na hora, no lugar, com a alguém errado.
Ninguém entende nada.
Quanto mais se relativiza tudo é relativo.
Nada é mais objetivo.
Subjetividades que tomam-nos.
A palidez dos rostos assombram.
Ninguém ama mais.
O amor é ultrapassado.
De séculos atrás.
E eu me envergonho.
Por ainda amar, por querer amar.
Solidão me assombra.
O futuro do mundo é a escuridão.
Engolidos pelo monstro de ser só.
Nada é relativo.
Tudo é superlativo.
Amor banalizado. Esquartejado.
Quebra-cabeça de sentimentos sérios.
Amém!
Que o futuro esteja convosco.
Não comigo!
Eu quero as relações do passado.
As estruturas convencionais!
Pelo amor de alguém superior.
Eu anseio por isto.
Mas meu grito é oco, vazio, surdo.
As novas relações dominam os seres.
Salve-se quem ainda quer ser amado.
Ascendam ao plano superior.
E lá esperem alguém.
Ou morram por aqui.
Nesta calamidade sentimental que se instala.
Que permanecerá.
Amém!
Ave Afrodite! Vênus!
Rogai pelos poucos filhos teus que ainda resistem.
Que Eros nos proteja, hoje e sempre!


(pra lala, filha de eros assim como eu)

terça-feira, 7 de abril de 2009

não ter vergonha de viver

o ímpeto de estar vivo.
e de querer estar.
a vontade incessante.
o querer viver.
livre.
despudoradamente.
criando visões e ruas.
assim.
com sede eterna.
aprender antes,
durante e depois.
apenas querer.
estar no mundo.
sem dívidas.
em cores vivas.
luzes brilhantes.
sem poços,
escuridões, tristezas.
viver jorrando vida.
transpirando alegria.
jogando e dançando.
toque o que tocar.
simples e só.
viver.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Sem Direito

Você não tem direito.
Não pode ficar pensando que me manobra.
De querer chegar em mim quando desejar.
Entrar na minha vida a qualquer momento.
Visitar meus sonhos ao seu bel prazer.
Não, você não tem esse direito.
Eu não vou mais permitir essa invasão tresloucada.
Sei que permiti muitas coisas.
A minha permissividade talvez tenha estragado tudo.
Mas, agora, chega!
O tempo passou, para você.
Eu não quero. Não sei nem se queria mesmo.
Acabado tudo. Salvas as almas que restaram.
Fechadas as feridas que existiam.
Restam apenas cicatrizes ínfimas.
Que não doem mais.
Não te permito mais nada em mim.
Nem que penses em mim.
Sentir saudade, nada, absolutamente.