diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Amor de carnaval (e sempre)

Eu e você estamos conectados pelo amor.
O amor.
A música.
Você me ensina, eu te escuto.
Ouvimos numa noite fria, na cidade da garoa, aquela voz.
A voz.
Os sentimentos que habitam em nossos corações.
Éramos jovens e não sabíamos que o nosso amor trancenderia o simples amor carnal.
Irmanados, como vindos de outras longínquas vidas.
Tu e eu.
O amor.
Somos assim, corações vagabundos que vagueiam num mundo de frevos, versos e reversos.
Caetanos, Erasmos, Robertos, Gilbertos e Joões.
Desafinados com a vida medíocre de meros mortais.
Sambas, chulas, recôncavos de pratos riscados na faca.
Pretos, nas vísceras que preenchem nossos corpos.
Somos amor, olhos nos olhos de lágrimas e sorrisos.
Somos místicos e carnais.
Mil e um carnavais.
Subindo e descendo atrás de blocos, de verde-e-rosas que nos levam além, de além de sempre.
Morenos de sol.
Me ama.
Que eu seguirei te amando até o fim.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Vermelho sangue

Ao som de "Maldição" - Drama - 1972 - Maria Bethânia


Essa mania de querer ser profundo ainda será a causa de minha extinção da face da terra.
O vício de tentar viver as histórias das letras de canções.
O sambas-doloridos-canção, dores de cotovelos alheias e minhas.
Entrelaçando meus temores e solidão às velhas músicas de feridas abertas.
De sangue escorrendo nos peitos de amantes.
Quase esquecida cantiga de Celestino.
O coração palpitante no chão empoeirado.
E não consegui mudar.
A intensidade trágica grega que me galopa nas veias.
Injetando seu veneno corrosivo em minh'alma.
Sangue quente.
Dores que expurgo como hemoptise nos versos escritos no papel.
Tinta vermelha borrando a superfície branca com os meus sentimentos.

O último bolero.

Elevo-mo
Cabeça erguida, não me lembro.
Sei.
Um dia eu fui.
Já não sou mais.
E que cheguem os dias em que todos também não o serão.
Noites de um vento morno.
Abismo, escuro e os olhos postos no velho livro de páginas amareladas.
Marcas que o tempo deixou naquela história de amor impressa em páginas pequenas e numerosas.
As idas e vindas de um casal apaixonado.
Farto! Sim, estou.
E que tudo o mais seja cinza, sobras das brasas que um dia arderam.
Queimaram.
O fogo extinto.
A casa aberta, as janelas azuis e as paredes brancas, caiadas.
Vento que adentra pelos corredores longos e silenciosos.
Era uma vez, eram muitas vezes, que sentado eu lia sob a luz tremulante de uma vela.
Os uivos que habitavam ao redor daquele lar, já não se ouvem mais.
Tudo é calmo e tranquilo.
Como o meu pequeno coração.
As mãos antes quentes, hoje frias, geladas.
O corpo pétreo, na mesma posição de outrora.
Livros empoeirados caem das estantes.
Só.
Nada mais, não sou mais.
Fostes.
As aranhas dominam a casa.
Tecem suas redes, finíssimas, por todos os cômodos.
Até os raios de sol da manhã tem preguiça de penetrar pelos vidros das janelas.
E aquelas paredes conservam umidades e lembranças de épocas antigas.
Deixem tudo quieto.
Toquem um bolero e tudo se resolverá.
Isso basta.
Até.