diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

domingo, 30 de março de 2008

Novo Dia

Hoje eu não quero escrever.
Não sinto absolutamente nada.
Já não sofro mais.
Sorrio.
Os dias demoram.
E eu não reclamo.
Apenas aguardo.
Resignadamente.
A sucessão de horas.
O sol está raiando.
Olho pela janela.
Vejo uma grande revoada.
As aves gorjeiam lindamente.
E a brisa da manhã é macia.
Eu continuo olhando.
Sem vontade de escrever.
Tudo é tão lindo.
E eu ali, parado.
Diante de todo um sistema.
Que continua inerentemente à minha vontade.
Eu senti que não controlo nada.
Absolutamente nada.
Nem um dos músculos do meu corpo.
Meus sentidos estão livres.
Como as aves que vi pela janela.
E eu aqui.
Ainda sem vontade de grafar palavras soltas.
Eu quero deixar as páginas do passado escondidas.
As páginas de amargura que se rasguem.
Eu sou agora um outro ser. Vivente.
E quero, agora sim, escrever.
Mas, desta vez palavras vivas.
Pulsantes, leves...

segunda-feira, 24 de março de 2008

Pequena Perfeição

Por quê tão linda assim?
Como se pode ser tão bela?
Tão completamente ascendente?
Assim, tão simples e complexo.
Tua beleza é algo diferente.
Bela como a Lua.
Tão embebida de amor.
Mais linda ainda.
Tão forte, assim geniosa.
E arrebatadora.
Dominadora de corações.
Pequena forma de perfeição.
E se sabe bonita, linda.
Faz uso disso.
Finge não gostar.
Mas o sabe.
Tão perfeita que é.
Traços harmônicos.
Tão singela. Diferente da altivez de tua beleza.
Sorriso irradiante.
Eu sei que parei no tempo.
Parei na tua beleza.
Fiquei te observando, admirando.
Ontem, hoje e sempre.
Eu te amo.
Eu amo tua beleza, tua voz, teus pés, tuas mãos.
Teus grandes olhos que me petrificam.
Ao simples olhar teu.
Eu tremo, congelo.
Nunca te consegui dizer tudo que sentia.
Eu tinha medo.
Tu eras muito grande, tão grandiosa, que eu temia.
Eu tive muito medo de seres tão bonita.
Eu quis dizer-te tanta coisa.
Mas foi impossível.
Como se está em frente à um Deus.
Eu temi, te respeitei.
Sonhei com beijos teus.
Com tuas mãos me acariciando.
E acordava no meio da noite, sozinho.
Mas nada me fez te esquecer.
Teus olhos, tuas mãos.
Tua tão infinita beleza.
Seguiste teu caminho.
E eu fiquei, mirando de longe.
Esperando a cada momento em que passarias por mim.
Sem mais me reconhecer.
E eu te via cada vez mais perfeita.
Te amando em silêncio até o meu fim.
Eu te amo.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Arrependimento.

Perdoem-me.
Eu nunca soube o que fazia.
E por isso hoje peço perdão.
Esqueçam minhas palavras.
Apaguem minhas erradas ações.
Perdoem-me.
Eu pensava saber agir.
Jamais aprendi.
Quis ser certo, errei sempre.
Agi para mim, contra mim.
Pensando fazer o bem.
Aos que machuquei.
Perdoem-me.
Peço honestamente.
Tive tempo de fazê-lo antes.
Mas no fim é que se pesa tudo.
É que nos arrependemos das coisas.
E sofremos no leito final.
Assim, sinto meu fim.
Tão próximo como minha sombra.
Que acompanhou vida inteira.
Guiou meus passos.
Esteve sempre colada à mim.
Perdoem-me.
Erros, muitos, cometi, arrependo-me.
Muitos erros perdooei.
E por isso sei que alguns me perdoarão.
Outros nem se lembrarão de mim.
Apenas do mal que lhes fiz.
Das coisas ruins que lhes disse.
Perdão.
Errei, se voltar errarei novamente.
Talvez até nos mesmos erros cairei.
Perdoem-me.
Eu só quis viver, ser como era.
Sentir meus amores, minhas agonias.
Minhas próprias dores sozinho.
Sem ajuda de ninguém.
Apenas somando minhas angústias no peito.
Sofrendo comigo mesmo.
Sem perturbar os outros.
Que sorriam sempre.
E eu não sabia nem chorar.
Externamente.
Minhas lágrimas corriam por dentro de mim.
Num ciclo interno, parte de mim.
Sempre em mim, dentro.
Perdoem-me.
Eu só fui.
Quero partir agora sem amarras.
Sem coisas que me arrastem pro fundo.
Pro escuro das almas amarguradas.
Liberar minha alma do corpo.
E seguir o rumo.
Já que tudo aqui é passageiro.
É efêmero.
Quero a eternidade.
Não, não me tomem como religioso.
Não faço apologias às religiões.
Apenas acredito que existimos numa matéria.
Que fica, o etéreo continua.
Não sei onde, nem como, nem por quê.
Apenas quero ir perdoado.
Perdoem-me.

Algo Aberto

Eu queria não estar no mundo.
Tão abertamente como estou.
Senti outro dia o cheiro de mato.
Que só a recordação traz.
E fiquei a pensar.
Quanto tempo me distancia,
Daquele tempo antigo.
Hoje estou só, sem você.
E só teu cheiro recordo.
Tua imagem se desfez.
Teus cabelos tão silenciosos.
Como se mortos estivessem.
E tu que me aquecias como ninguém.
Nossas mãos que se enredavam.
Minha boca que buscava a tua.
Tua, minha, nossa sensação.
Momentos tão íntimos.
Que eu fiz muitos saberem.
E me arrependo.
Queria me resguardar mais.
Minha natureza é muito desvelada.
E eu sofro. Tento mudar.
Algum dia, quem sabe, eu consiga.
Fazer-me diferente, naturalmente diferente.

sábado, 1 de março de 2008

Caligrafia da Vida

Hoje perdi meu tempo.
Parei para reler nossa história.
Nossas vidas quando juntas.
Quando eu dizia que te amavas.
Ou quando tu me dizias.
As vezes ainda nem falávamos.
Tão somente agíamos.
E isso bastava.
Quando nossos verdes eram claros.
E não amarelos desbotados.
Os nossos corpos vigorosos.
E não simples vestígios do que fomos.
Era tudo tão intenso, tão vívido.
E hoje só recuerdos.
Cosas que no tienen valor.
Tinha vontade de ser de novo.
La vuelta.
Tudo outra vez.
Muito mais intenso.
Arrebatadoramente vivido.
Ah, só pensamentos.
Escritos mal traçados.
Garranchos esquecidos no fundo das gavetas.
Lágrimas por uma vida passada.
Momentos distantes.
Felizes. Ou nem tão felizes.
Mas importantes.
Para a escrita da minha, das nossas vidas.
O que somos hoje devemos ao que fomos.
A tudo que vivemos. Juntos.