diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

domingo, 17 de julho de 2016

Baticum de Fevereiro

Bate e fica.
Vai e não volta.
Samba, requebra, rebola.
Baticum, bate tambor, anda.
Vai e fica.
Bate, quilombo.
Tenras carnes de coxas.
Pés descalços no chão de terra.
Bate, levanta poeira.
Sambe, semba, samba.
Bate, bate, rebola, requebra.
Bate onda do mar, que quebra, requebra doce e bela.
Espuma e sargaço do mar.
Vem, vai, bate, rebenta.
Rebento de terra morena.
Samba, semba, sambe.
Toca viola, chora viola.
Risca faca na louça, é festa, é fevereiro.
É dois, são rosas brancas, festa no mar.
Espelho, presente, perfume e flores.
Samba, samba, samba.
De adentrar pela noite o barulho, do prato, dos pés.
O barulho do mar quebrando nas pedras.
É festa, é fevereiro, é dois, dia de mar, dia de agradecer.
Bate, rebate, requebra, rebenta.
Saias rodadas, brancas batas, torsos de seda.
Colares de contas, muitas, contas.
Samba, semba, semba, sambe.
É festa, é terreiro, é luz na candeia.
Viva a voz, vivas, vivas.
Requebra, rebenta, dona dos cabelos negros como o negrume da noite.
Chora viola, risca faca.
Vivas, é fevereiro, é lavagem, é festa!

sábado, 16 de julho de 2016

Quantos?

Quantos homens estão dentro de mim?
Quantos braços fortes construíram paredes, muros e palácios?
Quantos desgarrados morreram assolados pelas misérias do mundo?
Quantos se perderam nas estradas da vida?
Quantos homens estão dentro de mim?
Quais foram meus antepassados que nestas terras aportaram?
Que trilhas cruzaram para estarem aqui há séculos atrás?
Que amores foram sufocados em porões de navios?
Quantos peitos derramaram leite em bocas miúdas?
Quantos gritos foram silenciados sob o jugo de açoites?
Quantos homens estão dentro de mim?
Quantos foram os que verteram seu líquido seminal para construir este povo?
Quantos ventres geraram estes filhos da pátria?
Quantos nasceram mortos de olhos abertos e assustados?
Quantos homens estão dentro de mim?
Quantas mãos se erguerão para me acusar?
Quantos golpes e tiros serão necessários para me derrubarem?
Quantos serão os que me levarão a última morada?
Quantos chorarão a minha morte?
Quantos?

(Dizia a mulher vestida de negro, cabelos presos em coque, em pé, no meio da praça.).