diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Mortal solidão.

Parou no meu coração.
Caiu em mim.
Permaneceu aqui.
Sempre em mim.
Dentro.
E cresceu.
Me tomou completo.
Escureceu minha alma.
Endureceu meu coração.
Congelou meus sentimentos.
E eu não pensei.
Esperava sofrer mais.
Porém foi tudo tão natural.
Sistematicamente aconteceu.
Era mais uma vez.
Talvez desta vez.
Olhei pra mim.
Vi-me envelhecido.
Olhos mortos.
Coração nas mãos.
Estendidas.
Entregando o que restou.
De quem tanto amou.
E por fim foi corroído pela solidão.
Que chegou silenciosa e mortal.
E se instalou.

sábado, 7 de novembro de 2009

Mentira...

Vós que bradais aos quatro ventos que sois felizes, mentis.
A felicidade não existe.
Vos iludis.
Acreditais no que vos digo.
Eu sei.
Não sejais tão ignóbeis.
Abris vossos olhos ao mundo que se mostra.
Tão cinzento e gélido.
Sem amor, sem compaixão.
Viveis numa realidade fingida.
Eu, pertencente aos desacreditados, moribundos vos digo:
Preferis a morte.
Só ela vos redimireis de todas as tolices que façais aqui.
E quando lá chegardes vereis que não minto.
Que só tenteis vos alertar.
E não me credes.
Que posso fazer?
Vós escreveis vosso destino.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A pequena.

Sentada debaixo daquela frondosa árvore ,cuja copa lhe fornecia uma grande sombra, pensava coisas soltas. O chão estava recoberto de folhas secas, folhas recém caídas, sementes de frutos bicados pelos pássaros. O silêncio era absoluto, naquele antigo jardim. Neste momento algumas outras folhas tocavam o chão. Como num balé cordenado, pelo vento, chegavam lentamente ao solo, para enfim repousarem. Seus longos cabelos estavam presos em grossas tranças. Seu vestido xadrez surrado mal lhe cobria o corpo. Usava-o desde os nove anos, já estava com quatorze. A saia já perdera o abanhado há bastante tempo. Seus pés encolhidos dentro daqueles velhos sapatos de couro gasto. Seus olhos ainda eram vivos. Sua tez alva como neve. Seus lábios tão encarnados pareciam pintados. Olhando o balé das folhas recostou a cabeça no grande tronco. E adormeceu. Num instante se viu novamente aos nove anos. Junto de seus pais. Apesar do tempo ainda podia reconhecer cada detalhe daquelas faces tão queridas. Abraçava-os com sofreguidão. Sentavam-se num enorme gramado, riam muito. Seu pai com o livro de contos que costumava ler para sua pequena. Ela deitada com a cabeça no colo da mãe, ouvia atentamente o que seu pai lia. O seu tradicional conto de princesa, fadas e príncipe. Quando seu pai terminou o conto fechou o livro com grande barulho. A menina então acordou. Assustada. Olhou ao redor, se deu conta que voltara à realidade. Uma lágrima lhe caiu sobre a face. Com sua mão suja de terra e de longos dedos enxugou-a. Levantou-se, ergueu a cabeça e seguiu rumo ao que lhe esperava. Fosse o que fosse.