diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Algo que eu queria dizer...

Eu não busco compreender o mundo
Eu apenas tento ser uma parte
Não quero ser um por fora.
Eu sempre tive medo das palavras,
Elas sempre me assustaram
E foi com elas que assustei, choquei,
Amei, sofri, senti, vivi.
O meu ser não é de falá-las
Intuito maior escrever,
Conversando com as gráficas
Com elas estou em boa companhia
Acerto dizer tudo que quero.
Sei sair de um extremo ao outro
Penso em tudo, em todos e em nada
Também
Quando menino temia aos céus
E com palavras de oração pedia perdão
Hoje não sei perdoar, não sei ser temente
É como se tudo que estava posto
Tivesse sido destruído...
Para uma nova construção erguer
O tempo é imaterial, é abstrato demais
Quem o tempo consegue parar
É dono de sua própria vida.
Os meros passantes aqui nada são
Somos como ser e estar, e nunca
Nunca somos, nem estamos
E no idílio furtivo eu escrevo sobre o amor
E também sobre o desamor, o arrependimento
Pois é verdadeiro e normal arrepender-se
Mesmo que isso só aconteça tempos depois
O tempo nada vale.
Para nós o que fica é o pouco que se faz
O quanto se viveu.
Atrás da porta sempre há uma vassoura
Para que nós sejamos colocados pra fora.
Expelidos como uma criatura abjeta
O vil, mais brincante da vileza é quem fala.
Quem escreve é um angelical Bocage
Pensava-se num quadrado...
Quando na verdade tudo girava
E por querer provar quase queimado morreu.
Em que alto monte pousou a águia?
Onde estão as botas de Judas?
Galinha, ovo, pinto?
Abacaxi e manga com leite?
Jacaré com cobra d’água...
Mais profundo que o centro da Terra.
Longe, tão longe, muito depois do Japão.
Praticamente uma volta completa.
Quem muda profundamente, diz:
“Dei uma mudada de 360 graus”.
Era preferível que mudasse apenas 180°
Assim, não voltavas pra onde estavas.
Primeiro em pé ou deitado?
Tanto faz, a ordem dos fatores...
Já se sabe o resto.
Supõe-se que nada se cria...
Minha avó já dizia:
“Formiga quando quer ser perder cria asa”.
Não será mais fácil perder-se andando?
Tabelionicamente falado as pessoas não nascem
São registradas.
E quando morrem? Não morrem?
Ninguém é semente.
Ou é sim.
“Papai plantou uma sementinha em Mamãe”
Ué? Não é assim, não?
Corda bamba é coisa de circo.
Bisturi de hospital, fruta de feira.
Não mais, do supermercado também!
Prédio é edifício. E casa?
Edifácil? Mas nada é fácil até que se prove o contrário.
O que existe além do céu, só sabe quem já foi.
A lua é um grande queijo?
Se eu for ao Sol o que acontece?
Passarinho gosta de voar, de cantar, de viver nas árvores.
Dá o pé meu loro.
O trem pega quem mesmo?
Ah, não os passageiros, não é?
Se os portugueses sabiam a onde iam,
Por quê chamaram o povo brasileiro de índio?
E que tamanho tinha o lençol que cobria o Brasil?
Shakespeare realmente existiu?
Julieta, Desdêmona, Lady Macbeth, Titânia, as comadres...
Eu pensei que escrever fosse difícil.
Que engano. Se junta ordenadamente algumas letras.
E posteriormente, nem tão ordenadamente, as palavras.
E surge algo que não estava posto.
Um novo Coliseu, um novo Taj Mahal.
Vinícius já muito escreveu, e fumou, e bebeu, que morreu.
Pessoa foi vários... E quando ele morreu?
Quantos cadáveres encontraram?
Lispector profundamente psicológica, um travo amargo na boca.
Simples agrupamentos de letras e depois de palavras.
É disso que se compõe a obra de todos, todos os escritores.
Algumas letras a menos e tudo ruiria
Tudo seria desconstruído, até que outrem chegasse e o fizesse.
Não de tal forma como eles fizeram, mas à sua maneira.
Com sua impressão peculiar.
O seu jeito.
E nada mais existiria para a humanidade.
Dela nada sobrará, além de suas obras.
Sejam elas quais forem.
Dos mais diversos tipos que sejam.
Quanto mais palpáveis mais destrutíveis serão.
Queimam-se livros, pintam-se paredes, quebram-se estátuas.
Apenas o pensamento permanece.
O seu, o meu, o vosso, o nosso.
Ele é inatingível.
Até que a morte nos separe.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Lucidez, desatino.

Ah gelada, calada, cilada.
Silente, em que caí.
E me mantive assim.
Em plena lucidez.
Numa imensa avidez pelo fim.
Até que veio a mim.
Em surdina, aquela menina.
De olhos tristes, de dedo em riste.
E me disse: "Eu te amei".
Aí eu calei, mais uma vez.
Num acesso de loucura.
Súbita tontura, alta bravura e doce ternura.
Afoguei-lhe as palavras com um longo beijo.
Quando virei-me percebi que o mundo havia parado.
Tudo imóvel.
Só nós dois nos movíamos.
Aquele rosto branco, de pó-de-arroz.
O corpo cheirando a alfazema.
O vestido roto, cobrindo um corpo em broto.
Uma sensação de alegria.
Energia que se movia entre nosso corpos.
Ela se soltou de mim.
O mundo voltou a girar.
E tudo caiu mais uma vez na banalidade.
Um infinidade de coisas aconteciam ao nosso redor.
Não éramos mais o centro de tudo.
Enfim, tudo acabou.
E vi que tudo era sonho.
Recuperei a realidade.
Nua, crua.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Medo novo.

Você é jovem! Não venha querer me ensinar como se faz!
Você nem sabe o que é o amor! Nunca viveu. Você não sabe!
Eu já vivi muito. Sofri outras, tantas, vezes.
Não, você não imagina. Você não tem a mínima ideia do que passei.
Eu, só eu sei.
Quantas vezes eu tive que me reconstruir.
Renascer. Feito em mil pedaços.
Colar-me. Fazer-me inteiro novamente.
Você nem existia ainda.
E eu já amava. Sofria, sim, muito mais.
Medo?
Não, antes nunca tive.
Sempre encarei tudo de peito aberto.
Das tapas não tinha receio.
Eu nunca tive medo antes.
E diante de ti, tão jovem, eu tremo.
Tu não sabes, tu não sabias, ou fingia não saber.
Pois hoje eu te digo.
Te amo.
E não quero que tenhas pena de mim.
Nem que me venhas socorrer.
Morrerei como das outras vezes.
E um dia me refarei.
Está escrito.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Quando amei.

Quem disse? Eu não acredito.
Já pensei.
Eu tive vontade de gritar.
Mas você não me ouviria.
Teus ouvidos não alcancei.
Eu te amei, sim.
Tive ciúmes, inveja de quem te tocava.
Dos beijos que não tive.
Eu te quis.
Tuas mãos não foram minhas.
Teu cheiro passava por mim.
E tu não ficavas comigo.
Tanto desejei estar onde estavas.
Sofri por perder o que nunca tive.
Chorei.
Não me envergonho de dizer.
Digo, brado para quem quiser ouvir.
Falei muito do meu amor.
Ainda falo hoje.
Sonhei noites seguidas.
Teus olhos negros nunca me enxergaram.
Eram cegos para mim.
Não para os outros.
Tua correção só existia com os demais.
Comigo sempre erros.
Eu sei, pra mim só o resto.
As migalhas que sobravam do banquete.
Cá, no meu canto eu chorava como o orvalho.
Lágrimas frias que congelaram meu coração.
O tempo tratou de me endurecer.
Não te quero mais.
Já estou cicatrizado.
Só te peço que não faças mais isto.
Nem comigo, nem com ninguém.
Afasta-te de mim.
Para todo sempre.
Mesmo petrificado tenho medo de recair em teu veneno.
De me deixar enredar na tua teia.
Tua simpatia e beleza arrasam até mesmo com o maior rochedo.
O que faria de mim, uma simples e pequena pedra?
Me faria pó.
E sei que desta vez não resistiria.
Não poderia ressurgir como Fênix.
Estaria aniquilado para todo o fim.
Destruído.
Por amar demais. Por te amar tanto.
Passa depressa por mim, te peço.