diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

quinta-feira, 22 de julho de 2010

O homem amarelo.

Ele tinha uma cor de mofo.
Assim, meio amarelado.
Talvez estivesse mais pra desbotado.
Seus olhos eram opacos.
Vivia com aquelas roupas velhas.
Farrapos, trapos jogados sobre o magro corpo.
Seus dentes fracos, careados.
O cabelo sem brilho, já grisalho.
Suas mãos eram grandes, de dedos longos.
Poderia ter sido pianista.
Seu cheiro era de flores.
Não de flores cheirosas, mas, de cravos de defunto.
Um cheiro abusado.
As pernas cansadas já não andavam tanto.
Os pés já não eram firmes.
Passos incertos.
Seu tom ocre esmaecido podia até ser belo.
Visto de longe, bem longe.
Ninguém gostava de ficar perto por muito tempo.
Alguns tinham náuseas, outros horror.
Não se encara o feio.
Tira a vista.
Olha para o outro lado.
Como olhar para o outro lado se o mundo é cruel?
Suas palavras, não sabíamos, eram sábias.
Mas, ditas por tal figura dantesca não eram acreditadas.
Morreu. Um dia. Como que de tão mofado se desfizesse.
Apenas restaram os trapos, os dentes, os ossos.
E um pequeno livro, pequeno mesmo.
Com folhas garranchadas à mão.
Do que se conseguiu decifrar, apenas uma frase guardei:
"O maior valor da vida é amar".
Era, sim, um sábio.

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