diário, escritos, rascunhos, pulsações de uma vida quase completa

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Desabafo.

Hoje me dói muito.
Sei que o tempo aplacará meu sofrimento.
Não me incomodo.
Sei que outras coisas acontecerão.
Que meus pensamentos mudarão.
Que durante séculos eu serei o mesmo.
Apenas novas feridas e cicatrizes.
Sei que não consegui amparar tua queda.
Mas estendi minha mão em ajuda a ti.
Quando estavas no fundo do poço.
Foi esse meu erro? Não o sei.
Sofrias e ofereci o meu ombro.
Para consolar-te.
E o que ganhei?
Só prestava enquanto estavas mal?
Acredito que foi isso.
Um dia, quando precisares de minha mão,
Não mais estarei lá.
Não por maldade, não por traição,
Mas por que o mundo me levará longe de ti.
Pelo menos até eu não mais sofrer.
Não sei o que pensas de mim.
Achas que eu me iludi? Que tudo confundi?
Não é? Tenho certeza que sim.
Talvez o tenha sido assim mesmo.
Mas, o que posso fazer?
Não consigo conceber tudo tão racionalmente.
Não nesse aspecto. E sofro, sofri, sofrerei.
De que me adiantaram tantas palavras amigas?
Quase nada. Não desfaço-me delas, não.
Apenas digo que não me tiraram as dores e cicatrizes.
Tu não tinhas o direito de surgir tão repentinamente em mim.
Não competia a ti absover-me tão rápido.
Envolver-me com tua lancinante beleza.
Tua despudorada atmosfera me tomou completamente.
Vivi repleto de ti, por alguns poucos momentos.
Imaginei um futuro, uma vida toda à frente.
Planos, apenas planos não realizados.
Passagens de sonhos não concretizados.
Sei que não valho muito. Mas amo.
E quando estou repleto de alguém sou mais.
Sou muito mais do que minah simples vida.
Um quase imortal.
Mas tudo é tão fulgás, passa ligeiro.
Como o tempo que corre implacável.
De que me adiantou tanta auto-confiança?
Tantos Pessoas, Clarices, Vinícius...
Apenas palavras jogadas ao mundo.
Sou um grito parado do ar.
O arquejante momento vivido.
Os beijos nunca mais sentidos.
As mãos jamais entrelaçadas.
As noites sem estrelas.
Fiz-me pó. Desintegrei-me.
Por ti, para ti. A ti.
Fui jogado no teu turbilhão.
Meu peito arde, pulsa incesantemente.
Como tudo internamente me queima,
Tenho que por fora, jogar nas letras tudo que sinto.
Não o que sou.
Afinal, ou que sou?
Nem sei mais.
Sou gente? Tu, tenho certeza, que não pensasses que eu era.
Me abriste o peito, enfiando-me uma adaga brilhante.
No sentido norte-sul. De cima a abaixo.
Deixando à mostra toda minha alma.
Sedenta de paixão recíproca.
Latejante de amor.
Viva, ainda, na esperança de um final feliz.
Como nos filmes que vimos juntos, nos livros que lemos.
E nada me sobrou.
Apenas estáticas memórias de passados longínquos.
Só te quero bem, cada dia mais.
Hoje te odeio, com a última centelha de vida que restou.
Um dia, quem sabe, voltarei a te amar.
A te querer junto a mim.
Com verdadeiros sorrisos de felicidade.
Ora não.
Não sei ser tão hipócrita a tal ponto.
Apesar de ser ator por natureza.
Não consigo estampar na cara um falso riso.
E fingir que tudo está bem.
Não, não está mesmo.
E digo-lhe mais, estou quase morto.
Sim, em tão pouco tempo, mas tudo dar-se assim.
Repentinamente, como os aplausos que nos afagam ao fim dos atos.
O meu ato final está perto, sinto.
Não me aflijo. Apenas lastimo.
Em ter que partir sem te dizer adeus.
Ou um até breve, logo.
Passas ao meu lado e não me vês.
Reduzi, sim, é verdade.
Sou, hoje, uma ínfima parte do que fui.
Se é que algum dia fui alguma coisa.
Se existi no mundo esqueceram de me registrar.
Como ser vivente do planeta.
Errei durante toda vida buscando um sentido para mim.
Tudo torto, torpe.
Uma mancha nas vidas.
Uma página escrita em rabiscos.
Que deve ser desconsiderada ao balanço final.
Todas as páginas das vidas pelas quais passei apagaram-se.
E não fiquei, nem marquei.
Quero destruir o que ainda resta no meu ser.
Não tenho vontade de comer, de viver, só choro.
E escrevo. Para que meus sentimentos (angústias) não me sufoquem.
Que eles possam respirar os ares que não me permitiram.
Os prazes que não vive. Não usufrui.
Avisos não faltaram. Nem faltarão no futuro.
Mas quem quer ouvi-los?
Só nos interessa ouvir o que queremos.
Não, não me arrependo de nada.
Viveria tudo outra vez.
Nem o bem, nem o mal eu apagaria.
Eu viveria tudo detalhadamente como vivi.
Pena que não podemos voltar atrás.
Não para mudar.
Arrependimento é coisa de covarde.
E eu sempre enfrentei a vida de peito aberto.
Louco, sei. Mas que vale passar e não amar.
E se amar é sofrer que eu possa sofrer muito mais.
Vão à merda os acomodados imbecis.
Que esperam o amor bater a porta.
Ou os imbecis que, como eu, ainda acreditam nesta,
Que é a maior mentira inventada por nós idiotas seres humanos.
O amor.
Ele não existe, reciprocamente.
Já passo a desacreditar que exista mesmo que não correspondido.
Nada é mais triste que essa certeza que trago no fim de minha vida.
Não tenho mais objetivo na vida.
Apenas desejo que o meu fim esteja muito mais próximo que o esperado.
E que eu não sinta o ar me faltar.
Que quando eu der por mim já não estou entre vós.
Entre tu e teus amores.
Que tanto me machucaram como agulhas enfiadas na minha carne.
Fico aqui sentado, traçando essas palavras nas linhas tortas das pautas.
Já quase sem respirar.
Sem qualquer animação.
Um espectro que rondou tua vida.
Por um curto período de tempo.
Só o tempo em que te servi de escoro.
Enquanto tu me precisaste.
Hoje quero a paz de morrer tranquilamente.
Sem levar o horror por que passei.
Sem memória de nada que vivi.
Um vazio completo me tome.
E eu me esvaia em sangue e dor.
Até a pontada final.
A última pulsação de um coração que tanto amou.
Mas, que nunca foi amado.
Não como eu queria.
Nem nunca o será.
Já que jaz no seio da terra.
Apodrece como todos que vão-se.
Um descanço eterno para minha tão esmigalhada alma.
Póstumo sentimento não carregarei.
Na escuridão do purgatório.
Estrelas apagadas e caídas ao chão.
Vou-me sem mais delongas.
Ao encontro do meu merecido.

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